Sobrado Dr. José Lourenço: Exposição Luminares da Arte Cearense para encher os olhos

10 de junho de 2014 - 01:40

É de encher os olhos a Exposição Luminares da Arte Cearense, que o Sobrado Dr. José Lourenço apresenta ao público nos meses de junho e julho de 2014. Em tempo de campeonato mundial de futebol com jogos em Fortaleza e de férias escolares, o equipamento mantido pela Secretaria da Cultura do Estado do Ceará disponibiliza, em visitação gratuita, uma seleção de obras representativas das artes visuais cearenses.

Nos três andares do prédio, localizado na Rua Major Facundo,154, no Centro da cidade, bem perto do Passeio Público, foram dispostas 97 peças de 23 artistas, muitos bem conhecidos, outros nem tanto e alguns anônimos. A maioria das obras pertence à curadora do Sobrado, Dodora Guimarães. O acervo pessoal, adquirido ao longo dos anos, é composto por fotografias, desenhos, gravuras, pinturas, esculturas e xilogravuras de artistas que nasceram no Ceará ou escolheram a Terra da Luz para morar.

“O conjunto de obras traça uma realidade artística pouco conhecida por seus conterrâneos e descortina nossa visão para o que é verdadeiramente produzido no Estado, para a arte – regional, sim, por produção, mas telúrica em sentidos e percepções”, observa a historiadora Natália Maranhão, integrante da equipe de educadores do Sobrado Dr. José Lourenço, edifício construído nos idos de 1860, hoje um centro de convivência em artes visuais.

As boas-vindas aos visitantes da exposição são dadas pelos fotógrafos Dário Gabriel e Jarbas Oliveira e pelo escultor Sérvulo Esmeraldo, no pavimento térreo. Ali, Dário, que nasceu em Petrolina, Pernambuco, retrata crianças no mar das Goiabeiras, em Fortaleza, enquanto Jarbas, natural do Cedro, traz de Juazeiro do Norte um senhor, com ex-votos ao fundo, na Casa de Milagres. Já o cratense Sérvulo, além de espalhar sobre o piso de tijolos sem revestimento folhas mortas em aço especial, aplica na parede uma armadura de formas geométricas bem características da arte que faz, dando a impressionante sensação de profundidade.

A exposição está aberta ao público desde o último dia 3 de junho. Moradores e visitantes de Fortaleza poderão apreciar os trabalhos até 31 de julho, de terça-feira a sexta-feira, das 9 às 18h, e aos sábados, das 9 às 17h. Com a proximidade da Copa do Mundo de Futebol no Brasil, a escultura em madeira de um jogador, obra de Francisco Graciano, foi escolhida para ficar logo ao fim da escada que dá para o primeiro pavimento, por onde é preciso passar para ter acesso aos pisos superiores, que acomodam os outros trabalhos da mostra. “Quem vier ao Sobrado Dr. José Lourenço vai ver uma seleção de grandes artistas”, aproveita a deixa a historiadora Natália Maranhão, integrante da equipe de educadores do equipamento.

Sendo assim, a capitã da exposição é a pintora, desenhista, tapeceira, escultora e gestora cultural Heloísa Juaçaba, grande homenageada da coletiva. Como deferência a ela, que nasceu em Guaramiranga em 1926 e morreu em Fortaleza em 2013 como uma das maiores expressões das artes visuais do Ceará, o segundo andar do Sobrado ganhou uma pintura em cor laranja para realçar as três peças da artista ali presentes. Heloísa Juaçaba utilizou eucatex, gesso e cadarços brancos para compor as obras, o que deu uma plasticidade incomum com o efeito de relevo.

No mesmo pavimento em que as peças da homenageada foram montadas, a curadora Dodora Guimarães reuniu trabalhos de outros grandes nomes das artes no Ceará. Além do desenho a grafite do escultor, gravador, ilustrador e pintor Sérvulo Esmeraldo, há imagens do premiado fotógrafo fortalezense Gentil Barreira e telas do pintor, desenhista, escultor e músico, Descartes Gadelha, este também nascido na capital.

As obras de Heloísa estão na companhia ainda do pintor, gravador, desenhista e ilustrador das Ingazeiras, Aldemir Martins (1922-2006), e do pintor, gravador, escultor, cenógrafo e figurinista de Fortaleza, Zé Tarcísio. “Heloísa Juaçaba é uma grande fada das artes visuais do Ceará, a grande madrinha das artes plásticas de Fortaleza”, reverencia Zé Tarcísio, aos 73 anos de vida e 53 de teimosia com a arte, como graceja.

 

Diversidade em linguagens, temas, técnicas, estilos e materiais

A Exposição Luminares da Arte Cearense revela uma diversidade em linguagens, temas, técnicas, estilos e materiais nas 97 obras reunidas no Sobrado Dr. José Lourenço.

A mostra tem desenhos do pintor, desenhista e escultor Leonilson, que nasceu em Fortaleza em 1953 e partiu aos quatro anos para São Paulo, onde morreu em 1993 como expoente da chamada “Geração 80” nas artes plásticas.

O artista plástico Francisco Almeida, natural de Crateús, reconhecido pela Fundação Nacional das Artes (Funarte) como criador da maior xilogravura do mundo, medindo 20 x 1,5 metros, faz parte da exposição também com uma xilo.

O escultor, gravador, desenhista e pintor Luiz Hermano Façanha Farias, que nasceu em Cascavel, e hoje vive em São Paulo, mais conhecido pelas instalações artísticas, está presente na coletiva com uma pintura.

Como a mostra reúne nomes de artistas que também adotaram o Ceará para viver, não poderia faltar o traço delicado do gravador, desenhista e pintor polonês Maciej Babinski, radicado no Brasil desde 1953 e em Várzea Alegre, no Sul do Ceará, há 22 anos.

E por falar em delicadeza, o que dizer do pássaro que surge do barro como se quisesse voar? Tão encantador quanto os temas com desenhos em relevo mostrando pavões que abrigam casais nas asas. São as peças de Maria Cândido Monteiro, natural de Juazeiro do Norte, onde nasceu em 1961 e morreu em 2010.

Usando também a cerâmica, o conterrâneo Bosco Lisboa surpreende com o realismo que aplica nas esculturas, formando os mais variados objetos do cotidiano, como sandálias, bolsa, colchonete, aro, pneu, numa semelhança tal que faz pensar em pintura aplicada ao ferro e à borracha.

Já o escultor Manoel Graciano, natural de Santana do Cariri, pai de Francisco Graciano, este também da terra de Padim Ciço e presente na exposição, não tem compromisso com a realidade ao apresentar seus fantásticos personagens em madeira. O leão também parece um tatu, um porco, um cachorro – depende do ponto de vista. O presépio tem um Menino Jesus imaginário e reis magos com peixeiras no lugar de ouro, incenso e mirra.

A madeira e a liberdade de criação são matéria-prima também para Racar, o Raimundo Caetano, mais um representante de Juazeiro do Norte, que faz parte da mostra com a escultura de um jacaré calango.

O escultor João Cosmo Félix é outro que nasceu em Juazeiro do Norte, em 1920, e mereceu uma sala em sua homenagem na Exposição Luminares da Arte Cearense. Nino, como é mais conhecido, ganhou reconhecimento depois da morte, em 2002. Ele também utilizou a madeira para criar seus animais característicos, principalmente o macaco. As peças do artista estão no último pavimento do Sobrado, entre o conjunto de obras expressivas da cultura popular e da vida no interior, com lendas, crenças, musicalidade e religiosidade próprias. A esposa, Perpétua Cecília da Conceição, natural de Juazeiro do Norte, também se fez artesã, e as obras guardam similaridade com as do companheiro, como se percebe nos trabalhos expostos no Sobrado.

Entre as poucas peças da exposição que não fazem parte do acervo pessoal de Dodora Guimarães, estão as telas do fortalezense Jorge Luiz, um tríptico que se destaca pela explosão de cor e claridade, como um dia entre noites.

O anonimato de algumas obras não foi impeditivo para inclusão na mostra. A exposição termina inclusive com algumas delas – esculturas em madeira, que lembram trabalhos em pedra, retratando casas, árvores e bichos.

 

Arte, afeto e cidadania

Entre as obras expostas, um móbile com vários cartões postais feitos artesanalmente, aproveitando restos de outros papéis que seriam naturalmente descartados, chama a atenção por reunir criatividade, bom humor, consciência socioambiental e, sobretudo, afeto. Os trabalhos são do artista plástico, pintor, desenhista, gravador, escultor e poeta, Hélio Rola, e estão endereçados à colecionadora Dodora Guimarães, juntamente ou não com outros destinatários, como o próprio marido, o escultor, gravador, ilustrador e pintor Sérvulo Esmeraldo, e por vezes fazendo referência a outras pessoas, como o pintor, desenhista e escultor Leonilson.

Durante a década de 1980, era assim que Hélio Rola gostava de se corresponder com os amigos e também com outros artistas, intelectuais e até políticos. Os belos postais eram mais do que uma expressão de arte, poesia e carinho, eram ainda um instrumento panfletário, no melhor sentido da palavra. “Aí vai o resultado das primeira chuvas do caju, reciclando o lixo que a vida moderna nos oferece”, diz a mensagem que ele enviou em 1984, em um cartão com a colagem da fruta, a partir de uma embalagem do creme dental Kolynos. “Barsil, Barsil. O país virou um grande bar. Embriaguez e desordem. A nova bandeira?”, perguntava, em outro postal, de 1997.

Então morador da Praia de Iracema, o artista adotava essa forma de correspondência inclusive para denunciar a degradação, em variados aspectos, pela qual aquela zona boêmia da cidade começava a passar. Mudou-se dali, mudaram as preocupações e também o meio de se comunicar. Residindo agora na Lagoa Redonda, pratica o que denomina de ativismo socioambiental contra a poluição sonora dos ruídos aéreos, porque defende uma postura político-ideológica do artista. E a artesania dos postais foi substituída pelo uso de recursos tecnológicos para continuar imprimindo arte. “Eu uso hoje as habilidades do computador e faço as postagens quase diariamente nas redes sociais”.

É mesmo uma linda galeria virtual. A evolução do cartão artesanal para o meio tecnológico, ele chama de Rolanet. E o que antes enchia os olhos de um só destinatário, na nova versão pode ser apreciado coletivamente. Aos 77 anos, Hélio Rola, que se considera artista desde criança, permite-se reinventar-se como tal, como médico formado desde 1961, como pesquisador em Fisiologia e como cidadão.

 

Da nova geração de “fazedores de arte”

Da geração de novos artistas visuais cearenses, não passa despercebida a técnica mista de Francisco Zanazanan, que mistura fotografia, photoshop e desenho, interagindo com o espectador. Fortalezense nascido em 1972, ele começou nas artes se sobressaindo com relevos em madeira pintada e grafismos inscritos, passou a trabalhar com hologramas e sombras, tornando esse grafismo sutil até se confundir com pintura, e aprofundou-se pelas artes integradas.

Entre os noviços na arte, chamam atenção também os desenhos e pinturas de Ise Araújo e Jabson Rodrigues, ela egressa de São Paulo, ele vindo do Pará, mas assumidamente cearenses. Ise, com imagens recortadas da menina que brinca amarelinha e da equilibrista que anda sobre fios de alta tensão tendo como fundo as próprias paredes do Sobrado, e Jabson, com a cabeça de uma mulher devota e uma cópula de cachorros, mostram que, além da afinidade na vida, pois são casados, eles se afinam na arte, com um estilo parecido.

Embora prefira se definir simplesmente como “fazedor de arte”, Jabson é um dos representantes da nova geração de artistas visuais cearenses na exposição montada no Sobrado Dr. José Lourenço. Com dois trabalhos expostos, que misturam desenho e pintura, produzidos em 2011 e 2012, ele se sente confortável em fazer parte de uma mostra mais pictórica, como assim avalia. “Algumas exposições são muito minimalistas, mais conceituais do que plásticas”, justifica.

Jabson nasceu em Belém, em 1975, e veio morar em Fortaleza aos nove anos de idade. Formado em Artes Visuais pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará, em 2008, é desde então que atua profissionalmente, mesmo com toda uma experiência anterior em design e ilustração que influencia nessa produção artística mais recente. Na cabeça de uma devota ou na cópula de dois cachorros, as duas obras do artista que fazem parte da Exposição Luminares da Arte Cearense, há de se notar elementos da arte em quadrinhos ou games dialogando com os traços que trazem referências à cultura popular nordestina e à memória afetiva da infância do autor.

 

Serviço
Exposição: Luminares da Arte Cearense
Período:
3 de junho a 31 de julho de 2014
Local: Sobrado Dr. José Lourenço – Rua Major Facundo,154 – Centro
Contatos: (85) 3101.8826 – 3101.8827 – sobrado.3107@gmail.com

Horários de visitação:

Terça-feira a sexta-feira: 9 às 18h
Sábado: 9 às 17h

Artistas:
Aldemir Martins, Babinski, Bosco Lisboa, Dário Gabriel, Descartes Gadelha, Francisco de Almeida, Francisco Graciano, Gentil Barreira, Heloísa Juaçaba, Ise Araújo, Jarbas Oliveira, Jabson Rodrigues, Jorge Luiz, Leonilson, Luiz Hermano, Maria Cândido, Manoel Graciano, Nino, Perpétua, Racar, Sérvulo Esmeraldo, Zanazanan e Zé Tarcísio

 

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