Secult Ceará aprimora metodologia na aplicação das políticas afirmativas em editais gerenciados pela pasta
1 de agosto de 2024 - 14:17
Resultado da aferição do documento de autodeclaração racial, de pertencimento étnico ou de pessoa com deficiência (PcD) passa a vigorar por ciclos de fomento de dois até quatro anos. Nesse intervalo de tempo, agentes culturais poderão, a depender do resultado da aferição documental, usufruir da reserva de vagas nos editais, chamadas ou chamamentos públicos geridos pela Secretaria
Metodologia de acesso alinhada com a dinâmica da Cultura no Ceará Foto: Felipe Abud
A Secretaria da Cultura do Ceará (Secult Ceará) reforça o compromisso com as ações afirmativas e reparatórias de direitos em seleções públicas e editais geridos pela pasta. Agora, agentes culturais negros, quilombolas, indígenas e pessoas com deficiência (PcD) contam com novas regras no procedimento de habilitação para acesso à política de cotas.
Importante passo à democratização dos investimentos no campo cultural, o novo conjunto de normas consta na Instrução Normativa publicada, no dia 1º de julho, pelo Diário Oficial do Estado. Construído coletivamente desde fevereiro, este avanço resulta da grande mobilização política da Secult Ceará para pensar caminhos de fortalecimento da implementação de cotas no âmbito da cultura.
“Imaginamos que a instrução normativa fortaleça a política de cotas, afirmando ela como direito importante às políticas culturais. Atualiza a metodologia de acesso a partir de um olhar alinhado com a dinâmica da Cultura no Ceará. Por esses objetivos, realizamos o debate com um conjunto de pessoas que estão envolvidas nas políticas de ações afirmativas no Governo do Ceará”, detalha o chefe de gabinete da Secult Ceará, Viana Junior.
Fortalecimento do trâmite seletivo
O procedimento para acesso à reserva de vagas foi aprimorado. Pensando na dinâmica do fomento cultural no Ceará, o procedimento de heteroidentificação deixa de ser uma etapa no processo seletivo dos editais. Pessoas autodeclaradas negras poderão solicitar acesso à política de cotas raciais por meio de oportunidade permanente no Mapa Cultura do Ceará e participar do procedimento de heteroidentificação, que será periódico.
Como nos processos anteriores, cada agente cultural deverá encaminhar apenas um dos seguintes documentos: o documento de autodeclaração racial, para ter acesso às cotas raciais; documento de pertencimento étnico indígena, documento de pertencimento étnico quilombola ou documento de autodeclaração de pessoa com deficiência, para acesso às cotas para pessoas indígenas, quilombolas ou pessoas com deficiência, respectivamente. Quem se adequar a mais de uma política de cotas deve optar por apenas uma.
O documento de autodeclaração racial e o resultado do procedimento de heteroidentificação, assim como, o documento de pessoa com deficiência e o documento de autodeclaração étnico assinado por três lideranças/ associação, passam a vigorar por meio de ciclos que variam até 24 meses (referente às cotas raciais e cotas para PcDs) ou até 48 meses (referente às cotas étnicas para pessoas quilombolas e às cotas étnicas para pessoas indígenas).
Cotas raciais
“Na Secretaria da Cultura operacionalizamos esse compromisso político. Um compromisso com o povo cearense e com os fazedores da cultura que, muitas vezes, foram retirados ou não lhe foram garantidos os processos de acesso a investimento”, explica a coordenadora de Diversidade, Acessibilidade e Cidadania Cultural (Codac), Dediane Souza.
Conforme a cartilha “A Implementação das Cotas Raciais e o Procedimento de Heteroidentificação no Brasil” (2024), disponibilizada no site da Secult Ceará, a pessoa agente cultural precisará encaminhar o documento de autodeclaração racial e submeter-se ao procedimento de heteroidentificação. Esse procedimento é realizado por uma comissão que, na presença de cada agente cultural, vai aferir exclusivamente o conjunto de características observáveis (cor da pele, cabelos, formato do rosto, nariz, olhos ou lábios) – sendo a cor da pele o marcador social de raça mais importante.
“Somente as pessoas negras (negras-pretas e negras-pardas) poderão usufruir desta política. Para isso acontecer, é necessário considerar os marcadores sociais de raça relacionados à combinação dos aspectos fenotípicos que os caracterizem como pertencentes ao grupo racial negro”, orienta a cartilha.
A banca de heteroidentificação não tem papel de julgar ou definir qualquer pertencimento identitário. É formada por uma comissão heterogênea de raça/cor, gênero e naturalidade, com o devido conhecimento comprovado na área das políticas afirmativas e das relações étnico-raciais.
Após validação da autodeclaração racial pelo procedimento de heteroidentificação, a Secult Ceará poderá habilitar o/a agente cultural para usufruir da reserva de vagas por um ciclo de fomento de até 24 meses. Passado esse período, agentes culturais que desejam habilitar-se por meio de cotas raciais precisarão entregar novo termo de autodeclaração racial e participar de outra etapa de heteroidentificação.
“Hoje, a banca de heteroidentificação é uma tecnologia negra muito importante na garantia do acesso das pessoas negras no serviço público, lugares de liderança e nas políticas públicas, em geral. Preservamos esse princípio, aliado à necessidade de aprimoramento da metodologia aplicada no âmbito da cultura. Isso foi possível pelo comprometimento da equipe da Secult Ceará e a importante colaboração da Secretaria da Igualdade Racial do Ceará”, completa Viana Junior.
Cotas étnicas
Segundo o assessor de Fomento da Secult Ceará, Vinicius Nascimento, a expectativa é de trâmites mais ágeis e eficientes. “Uma sistematização única confere maior dinamismo a esse processo das bancas. Futuramente, basta cruzar os dados da pessoa inscrita no edital e de quem já é habilitado às políticas de cotas. E assim, com isso, entregar os resultados de uma maneira mais prática”.
Evento Monegrin – Moda Negra, Indígena e Periférica Foto: Sandy Albuquerque
Para usufruir da reserva de vagas para pessoas indígenas é necessário, no ato da inscrição de editais que deseja concorrer, encaminhar a autodeclaração de pertencimento étnico indígena. Deve ser assinado pelo/a agente cultural e por três lideranças ou associação da aldeia/território da etnia/povo que se declara pertencer – afirmando que mantém laços familiares, econômicos, sociais e culturais com a referida comunidade.
Será possível atribuir a habilitação do/a agente cultural na política de cotas para pessoas indígenas por um ciclo de até 48 meses. Após esse período, será preciso submeter-se a outro procedimento de habilitação.
Já para usufruir da reserva de vagas para pessoas quilombolas é necessário, no ato da inscrição de editais que deseja concorrer, encaminhar a autodeclaração de pertencimento étnico quilombola. Deve ser assinado pelo/a agente cultural e por três lideranças ou associação do quilombo que se declara pertencer – afirmando que mantém laços familiares, econômicos, sociais e culturais com a referida comunidade.
“Para os povos indígenas e comunidades quilombolas, o processo não é apenas de autodeclaração, acompanha também o reconhecimento comunitário da liderança desse território”, reforça Dediane Souza.
Cotas PcD
Caso tenha interesse em usufruir da reserva de vagas para pessoas com deficiência, é necessário, no ato da inscrição de editais que deseja concorrer, encaminhar a autodeclaração de pessoa com deficiência, que deverá ser registrada a condição/deficiência e assinada pelo/a agente cultural.
Será possível habilitar-se à reserva de vagas por um ciclo de até 24 meses, exigido, após esse período, outro procedimento de habilitação conforme previsto neste artigo.
“O mais importante das ações afirmativas é entendermos que essa política não é individual. É uma política pública que muitos indivíduos vão acessar. É um benefício da comunidade. A política de ações afirmativas vem para reparar um contexto histórico de desigualdades. Preza por esse processo de equiparar os direitos”, finaliza a coordenadora Dediane Souza.
Trabalho coletivo
O ato normativo é fruto do intenso diálogo entre a Secult, por intermédio da Coordenadoria de Diversidade, Acessibilidade e Cidadania Cultural (Codac), e instâncias de participação social como o Comitê de Expressões Culturais Afro-brasileiras do Ceará, Comitê de Culturas Indígenas, Grupo de Trabalho de Acessibilidade, bem como a importante colaboração da Secretaria da Igualdade Racial do Ceará (Seir) e Secretaria dos Povos Indígenas do Ceará (Sepin).